domingo, 20 de março de 2016

Resenha de dois garotos se beijando



Dois garotos se beijando



 Autor: David Levithan

Editora: Galera Record
N° de páginas: 224
Nota:
Sinopse: "Dois Garotos se Beijando – Baseado em fatos reais e em parte narrado por uma geração que morreu em decorrência da Aids, o livro segue os passos de Harry e Craig, dois jovens de 17 anos que estão prestes a participar de um desafio: 32 horas se beijando para figurar no Livro dos Recordes. Enquanto tentam cumprir sua meta — e quebrar alguns tabus —, os dois chamam a atenção de outros jovens que também precisam lidar com questões universais como amor, identidade e a sensação de pertencer."









Imagine que você precisa completar uma tarefa difícil e que seus maiores obstáculos serão seus próprios limites físicos e emocionais. Agora duplique estas barreiras pelo tempo necessário para concluir a tarefa, por exemplo, 32 horas seguidas. Você pode até dizer: ah, eu consigo!
Será?
Será que você suportaria enfrentar o preconceito das pessoas unicamente para reafirmar seu caráter? Suportaria o ódio, a raiva, a hipocrisia e principalmente, o medo daqueles que possuem aversão aos que fogem dos padrões sociais?
Basicamente é este o fio da história em Dois Garotos Se Beijando, de David Levithan.
Confesso que pensei em lê-lo anteriormente, mas alguns detalhes me levaram à outros livros: a versão português do título não me agradava, a inexistência de uma estrutura capitular me incomodava e a capa do livro também não me dava tesão (capas, sim, influenciam na escolha de uma obra).
Em Dois Garotos Se Beijando nós temos 8 principais personagens. Craig e Harry, Peter e Neil, Avery e Ryan, Tariq e Cooper. Eles são adolescentes gays que possuem relações bem distintas com o danado do Cupido. A história se inicia quando Craig decide quebrar o recorde de beijo mais longo do mundo (ele deveria ultrapassar o tempo de 32 horas). A motivação para atingir o recorde surge como protesto depois de visitar Tariq, amigo que estava se recuperando após ter sido espancado covardemente por ser gay.
Craig acredita que se ele mostrar ao mundo o beijo mais longo da história as pessoas poderão se conscientizar de que gostar de garotos não o torna um saco de pancadas para os desforros homofóbicos. Então ele convida seu ex-namorado, Harry, para lhe ajudar nessa tarefa. Mesmo depois do término do namoro, Craig e Harry de alguma maneira ainda se compreendem e se consideram íntimos a ponto de manter o beijo por tanto tempo. E é a partir daí que o beijo passa de um simples contato físico para uma resposta simbólica a sociedade.
Ao longo da leitura os outros personagens surgem: Peter e Neil são garotos que possuem uma relação estável , mas ainda precisam lidar com a opinião da família de Neil sobre ser gay. Avery, personagem transexual (menino que nasceu num corpo de menina) conhece Ryan numa festa gay e ambos possuem cabelos coloridos. Os pais de Avery os apoiam em sua transição enquanto Ryan começa a alimentar um carinho por Avery. Tariq, como já dito, sentiu na pele o preconceito e é quem decide ajudar Craig e Harry no longo beijo. E por fim, o personagem mais contrastante da história: Cooper. Ele foge de casa depois que seus pais descobrem que ele vive entre aplicativos gays, fingindo ser outras pessoas, sentindo-se desejado e lutando para manter seu ego nutrido com mentiras.
Preciso ressaltar que o fato de termos garotos no fim, no meio e no início de suas relações me faz pensar diretamente no passado, presente e futuro da mensagem do livro. Calma, eu explico.
Quando comecei a ler Dois Garotos Se Beijando fiquei um pouco confuso com relação a quem narrava a história. Havia pessoas flutuando, observando e se preocupando com àqueles garotos. Mas quem eram? Foi no meio do livro que compreendi que quem conta a história são pessoas mortas, pessoas que tiveram um passado e um fim. Elas estavam falando de um presente e desejavam que o futuro fosse menos complicado para aqueles meninos. Acredito que este foi o melhor posicionamento que Levithan poderia ter dado aos narradores. Confesso que a leitura ficou um pouco mórbida quando descobri este detalhe, afinal de contas, eles morreram de AIDS e estão observando os passos dos garotos, se deleitando com suas descobertas e sofrendo com as frustrações vividas por eles.
Levithan consegue em Dois Garotos Se Beijando exemplificar de maneira bem clara a diversidade das relações. Em certos pontos você consegue se apegar bastante à alguns personagens, em outros você percebe a atualidade do tema tratado no livro. Sabemos que ainda é complicada a auto afirmação para os gays. A família por vezes não aceita, os amigos fazem piadas, as redes sociais extrapolam os limites. Tudo isso se acumula e o medo e a depressão passa a sufocar estas pessoas que só querem amar quem quer que seu coração escolha. E isso pareceu muito caro para os narradores do livro.
Em meio à oito histórias, imaginei que a conexão entre os personagens seria maior. A repercussão do beijo na TV e na internet foi o máximo que aproximou todos. Embora saiba que nem todos poderiam receber o mesmo peso dramático no enredo, alguns personagens poderiam estar mais próximos do centro do livro e me pareceram peças complementares. Tariq, por exemplo, é assistente de produção durante toda a história (ele foi o estopim para Craig). A transição de Avery poderia ter sido mais abordada (uma natureza está sendo redefinida), bem como a complexidade da cabeça de Cooper, já que certamente seus problemas poderão atrapalhar sua vida adulta.
No mais, a leitura é linda e cheia de um amor fora dos rótulos. É um livro que mostra as verdadeiras consequências quando se gosta de alguém, quando se vive uma mentira ou quando precisa se aceitar para que os outros lhe aceitem também. Embora não existam capítulos, a história não me pareceu cansativa; muito pelo contrário, conseguiu me prender intensamente aos personagens e a atualidade do tema. Deveria ser uma leitura obrigatória para todos os jovens que ainda estão confusos e que necessitam de uma visão mais ampla do que é ser gay. Indico mil vezes.
Ah, duas coisas:
Uma: como disse, não gostei muito da capa do livro. Assim que terminei de lê-lo resolvi homenagear meus mais queridos personagens: Avery e Ryan. Consegui exemplificar através de cores e formas a intensidade e conexão que senti entre eles:
E dois: o livro é cheio (literalmente) de belas passagens que valem a pena escrever naquele caderninho de quotes e guardar para seus netos ^^
 See ya ^^,
Alex

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